No dia 18 de Julho foi comemorado o 18° aniversário da batalha de Shroma (Geórgia), na qual o corpo expedicionário ucraniano “Argo” tomou e defendeu a aldeia de Shroma, o ponto estratégico na guerra da Abecásia de 1992-93. Os voluntários ucranianos da UNA-UNSO superaram a guarnição de cerca de 600 “cossacos” russos, resistindo mais tarde ao avanço do exército regular russo e separatistas locais.
A batalha de Shroma nas memórias do voluntário ucraniano Yuriy Kolesnikov, conhecido também como “Shamil” e “Veselchak-U”.
Na altura da guerra eu tive 22 anos, escrevi estas memórias em Maio – Junho de 2004, corrigindo as no período de 2004-2008 com a informação que veio da parte oposta. A minha visão da guerra é subjectiva, pois eu via a guerra das trincheiras georgianas como um nacionalista ucranianos, russo de origem étnica. Não se apressem com as avaliações, olhem para a guerra com os meus olhos...
Início da guerra
Primeiro grupo dos ucranianos, oito pessoas no total chegou a Geórgia no dia 30 de Junho de 1993. Vestimos as uniformes militares no avião, eu fiquei à civil. Os que estavam fardados, passaram o controlo alfandegário sem problemas, outros tiveram que mostrar as identificações. No UNA-UNSO sou conhecido pelo pseudónimo de “Shamil”, mas na Abecásia combati com os documentos do Yuriy Serhiyovych Teteryuk. No dia 1 de Julho estávamos em Sukhumi, fazíamos a parte do Batalhão Especial dos Fuzileiros Navais do Ministério da Defesa da Geórgia. No dia 3 de Julho recebemos as armas, na tarde do mesmo dia a cidade já estava debaixo do fogo inimigo.
As nossas posições se situavam à uma distância de 1800 m da aldeia de Shroma, junto à monte com o mesmo nome. Os ucranianos cavavam as trincheiras, os georgianos não, diziam que não são acostumados cavar a sua própria sepultura. A tarde, os russos nós acertaram com o fogo dos mísseis GRAD. Um dia antes eles dispararam três vezes, primeiro disparo era normal, dois outros produziram fumo: branco e cinzento. A minha garganta ficou como se fosse queimada, perdi a respiração, teve na boca o sabor de petróleo e a sangue. Depois me saiu a pele da língua e da faringe, perdi o paladar. Hoje, quando preciso de atestado médico mostro ao doutor a minha garganta...
O segundo grupo apareceu no batalhão no dia 12 ou 13 de Julho, eles logo foram armados e levados como reforços às posições junto a Shroma. No dia 14 de Julho começou a operação. De dia aproximava-mos ao rio Gumista, de noite voltávamos as posições iniciais. Uma vez estivemos tão cansados que dormimos na estrada de alcatrão, que chamávamos de “estrada nova”. O Batalhão georgiano de Akhaltsys, nossos camaradas, era composto em 90% pelos novatos...
Dia 17 de Julho, para chegar ao monte tivemos que passar pelo campo minado, não era problema, pois as minas eram anti-tanque. Descemos e caímos sobre os “cossacos” e chechenos. Tivemos contas com os “cossacos” que nos prometiam na rádio “despedaçar as nossas peles”. Aceitamos o conselho e no dia 14 de Julho, numa operação de reconhecimento, conjunta com os georgianos, também não aprisionamos nenhum “cossaco”, mesmo quando estes levantavam as mãos. Com os chechenos era mais difícil, eles são bons soldados, se zangam no combate. Nas montanhas só ficávamos separados quando se acabavam as munições. Ninguém iniciava o ataque da baioneta, pois todos são espertos e sabem lançar as granadas...
Primeiras baixas
Nas costas tenho cinco granadas para o RPG-7. Das duas centenas de atacantes, ucranianos são 25 pessoas, para a maioria é a primeira guerra ao sério, embora alguns já passaram pela Transnístria e Karabakh.
Quatro ucranianos avançaram debaixo do fogo inimigo. Eles protegem o Gia (Giorgi), o franco-atirador do Batalhão de Akhaltsys. O nosso escuteiro “Veres” incomoda o atirador russo com o fogo da sua metralhadora pesada. Este não aguenta e se levanta, Gia dispara e da janela de uma casa à uns 300 metros cai o fuzil SVD. O atirador inimigo foi primeira baixa naquela operação. Depois começaram disparar os RPG dos “cossacos”, mas os georgianos e ucranianos estão pela encosta acima, protegidos pelos arbustos. Além disso, a metralhadora do “Veres” não os deixa apontar com a precisão. Cada segunda bala sua era anti-tanque e incendiária, ele abateu dois “cossacos” através da parede, três outros pelas costas, quando eles fugiam. Mas o último “cossaco”, antes de morrer, atingiu o nosso grupo avançado. Dois ucranianos foram retirados debaixo de fogo pelo franco-atirador Gia. Outros, incluindo “Veres” foram salvos pela enfermeira georgiana Marina do Batalhão de Fuzileiros navais. Durante o resgate abatemos cerca de duas dezenas dos “cossacos”, contando com aqueles que vimos. Escutamos pela rádio que os russos nós atribuíram o triplo...
Chegamos na entrada da aldeia e os sapadores desactivaram as minas. Na aldeia entraram 21 voluntários ucranianos, as alas eram asseguradas pelos fuzileiros navais georgianos. “Argo” deveria ter o apoio de dois blindados ligeiros e um tanque, mas estes não entraram na aldeia, receando as possíveis emboscadas.
O contra-ataque russo
O dia 18 de Julho passou em tiroteio. O franco-atirador Gia trabalhava sozinho. Os dois ucranianos com RPG eram guiados pelos observadores: quando reparavam o movimento em alguma janela, se disparava com o RPG.
No dia 19 de Julho queimamos o tanque russo T-55 modificado, rebentou a sua munição. Os georgianos receberam o complexo móvel anti-tanque 9K111_Fagot (AT-4 Spigot pela classificação da NATO), mas não sabiam como usa-lo. Ucraniano “Bayda”, ex-militar mostrou como apontar, como carregar, um dos jovens soldados georgianos carregou o gatilho e tanque foi pelos ares... Às 16h30 os fuzileiros navais russos iniciaram o ataque, avançavam com uma longa fileira, todos tinham coletes prova de bala com laminas de titânio e metralhadoras com lança-granadas. Ucraniano “Obukh” quase não precisava de apontar, só movia a sua metralhadora de esquerda para a direita. Entre 250 balas ele tinha 200 balas anti-tanque e incendiárias, mas primeiro deixou os russos a aproximarem-se à uns 100-150 metros, conseguindo infringir pelo menos 20 baixas. Anos mais tarde eu soube que Batalhão de Akhaltsys deixou as posições sem nós avisar e os russos vendo isso decidindo “entrar em beleza”...
Os fuzileiros russos tiveram um óptimo apoio militar: duas baterias de lança-minas, bateria dos GRAD e tanques. O centurião “Ustym” pegou na rádio e em belo russo mandou palavrões ao comandante dos tanques russos, redireccionando o seu fogo contra a bateria de lança-minas dos separatistas. Os russos acreditaram mais em “Ustym”, o militar de carreira do que no seu próprio observador... Baixas ucranianas
Os russos penetraram na nossa retaguarda, um deles lançou a granada F-1, ferindo “Ustym” que ficou contuso. Ele ainda conseguiu com uma das mãos (outra foi atingida pelos estilhaços) disparar uma rajada matando alguns atacantes. Mas depois perdeu os sentidos. Uma das balas atingiu ucraniano Leonid “Lucien” Tkachuk, o “Cviakh”. Quando abatemos todos os russos escondidos no campo de maçaroca ele pediu: “me matem, perdi a mão!” Naquele momento, entre 21 ucranianos sete já estavam feridos. Um era atingido pelo franco-atirador e levado ao hospital. Outros seis estavam no campo de batalha, “Lucien” era oitavo. Ainda não sabíamos que um estilhaço da mina matou o nosso operador de RPG, Serhiy Obukh, o “Dibrova”. Ele estava na montanha com os georgianos, não devia voltar, mas sabia que os companheiros estão em baixo, cercados pelos russos. Voltou, abateu as metralhadoras russas e morreu. Este foi o seu primeiro e último combate.
Usando uma pausa no combate “Bayda” tomou o comando e começou retirar os feridos. Os russos avançavam com dois grupos, um ia pela estrada, atrás dos feridos, outro contornava o campo de maçaroca. Leonid “Lucien” começou disparar contra ambos, salvando os feridos e chamando o fogo sobre si. Ele atingiu os dois grupos, eu apenas abati os que ainda se mexiam.
Comecei por carregar o “Lucien”, contra nós disparavam lança-minas, ele resistia, entrou em choque. Depois apareceu o seu pai, eles sempre estiveram juntos, fiquei com muito medo, se morresse não havia crise, mas não conseguiria tirar daqui dois feridos. Pai se zangava com filho, ele só abanava a cabeça. Juntos retiramos o “Lucien” debaixo de fogo, durante duas horas o carregamos nas mãos, não tivemos nem os helicópteros, nem os carros. O seu coração parou por três vezes, é uma visão terrível, assistir como um pai enlouquece calmamente junto ao corpo do seu filho...
Após a morte do filho “Obukh” não recuperou. Mais tarde ele se vingou, matou mais de 100 pessoas no lado dos separatistas. No dia 18 de Julho de 1993 Leonid “Lucien” Tkachuk, o “Cviakh”, completou 19 anos. No dia 19 ele morreu. Essa foi a sua terceira guerra, antes ele passou a Transnístria e Karabakh.
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